Uma cápsula espacial russa, carinhosamente apelidada de “Arca de Noé”, retornou à Terra trazendo um grupo nada comum de passageiros: 75 camundongos, mais de 1.500 moscas, sementes, microrganismos e células vivas. O curioso experimento, que durou 30 dias em órbita, teve um objetivo ambicioso, entender como diferentes formas de vida se comportam fora do nosso planeta.
Pode até soar como enredo de ficção científica, mas trata-se de uma pesquisa real e crucial para o futuro das viagens espaciais. Os resultados podem ajudar a preparar missões tripuladas de longa duração e até oferecer pistas sobre as origens da vida na Terra.
A missão e o retorno da cápsula Bion-M nº 2
Batizada de Bion-M nº 2, a cápsula foi lançada em 20 de agosto de 2025, a partir do cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão, acoplada a um foguete Soyuz-2.1b. Durante um mês, ela orbitou o planeta a cerca de 370 a 380 quilômetros de altitude, exposta à microgravidade e a intensos níveis de radiação cósmica.
O retorno aconteceu em 19 de setembro, nas estepes de Orenburgo, na Rússia. Ao tocar o solo, a cápsula provocou um pequeno incêndio, rapidamente controlado por equipes de resgate que chegaram de helicóptero. O foco era retirar os animais o quanto antes e iniciar os exames médicos ainda no local.
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Um laboratório vivo em miniatura
Dentro da “arca”, viajavam camundongos, moscas, culturas celulares, microrganismos, sementes de diversas plantas e rochas com cepas de bactérias. Era, literalmente, um ecossistema científico completo, projetado para observar como diferentes formas de vida resistem ao ambiente espacial.
Logo após o pouso, os primeiros exames foram feitos em uma tenda médica montada ali mesmo. Durante a madrugada, todo o material biológico foi enviado ao Instituto de Problemas Biomédicos (IBMP), em Moscou, onde as análises detalhadas continuam.
Por que enviar tantos seres vivos ao espaço?
A missão, organizada pela agência espacial russa Roscosmos em parceria com a Academia de Ciências da Rússia, buscou entender como a microgravidade e a radiação cósmica afetam organismos vivos, desde células simples até mamíferos.
Os estudos se dividiram em dez áreas principais, entre elas:
- Fisiologia animal, para observar como o corpo reage à ausência prolongada de gravidade;
- Adaptação de plantas e microrganismos ao ambiente espacial;
- Proteção contra radiação, essencial para futuras naves tripuladas;
- Projetos educacionais, desenvolvidos por estudantes da Rússia e da Bielorrússia.
Com isso, os cientistas esperam antecipar reações do corpo humano em missões de longa duração, como uma futura viagem a Marte.
O experimento “Meteorite” e a origem da vida
Entre os testes realizados, um dos mais fascinantes foi o “Meteorite”, voltado a investigar a teoria da panspermia — a ideia de que a vida pode ter se originado no espaço e chegado à Terra por meio de meteoros.
Para isso, os pesquisadores fixaram rochas basálticas com bactérias resistentes do lado de fora da cápsula. A hipótese era simples e provocante: se esses microrganismos sobrevivessem ao calor extremo da reentrada na atmosfera, isso reforçaria a possibilidade de que a vida pudesse ter viajado entre planetas.
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Pequenos tripulantes, grandes descobertas
Durante o voo, os camundongos foram monitorados por câmeras internas, e as imagens mostraram os pequenos roedores flutuando no ambiente sem gravidade. Já as moscas foram analisadas imediatamente após o pouso, principalmente em relação à atividade motora, para identificar possíveis danos neurológicos causados pela exposição ao espaço.
Por mais improvável que pareça uma “Arca de Noé” repleta de moscas em vez de leões e girafas, essa missão mostra como a ciência moderna tem reinventado seus métodos, buscando respostas em escalas cada vez menores e mais precisas.
Os resultados da Bion-M nº 2 devem ajudar a criar novas tecnologias de suporte à vida no espaço, aprofundar o entendimento sobre resistência biológica e até fornecer pistas sobre a origem da vida — não só na Terra, mas também em outros mundos.
Enquanto isso, nós, aqui embaixo, continuamos assistindo com fascínio a essas jornadas científicas. Afinal, o espaço pode parecer distante, mas a cada nova missão, ele se torna um pouco mais parte da nossa realidade.