Você já presenciou ou viveu essa cena: o garçom se aproxima da mesa com educação, dá um sorriso, pergunta o que os clientes desejam beber, e, do outro lado, recebe apenas olhares. Nenhum pedido, nenhuma palavra, nenhum gesto. Só um silêncio constrangedor, quebrado apenas pelo barulho dos talheres ao fundo ou pela conversa das outras mesas.
Esse tipo de situação, cada vez mais comum, tem recebido um apelido curioso: o “Olhar Gen Z”. Trata-se de um comportamento bastante observado entre jovens da chamada Geração Z, aqueles nascidos entre meados dos anos 1990 e o início dos anos 2010. Eles olham fixamente para o atendente, mas não respondem. É como se o olhar fosse suficiente para se comunicar. Só que, para quem está do outro lado, não é.
Esse hábito tem deixado muitos profissionais de restaurantes desconcertados, seja em grandes cidades do Brasil, nas ilhas turísticas da Grécia ou em destinos onde a hospitalidade é parte essencial da experiência. A troca verbal, esperada em situações simples do dia a dia, parece ter perdido espaço.
Quando o silêncio vira linguagem
O primeiro pensamento de muitos é que se trata de falta de educação. Mas não é bem assim. Especialistas em comportamento têm observado que o “Olhar Gen Z” pode estar ligado a transformações profundas na forma como os mais jovens se comunicam.
Durante a pandemia, grande parte dessa geração viveu momentos cruciais da adolescência ou juventude isolada em casa, com interações limitadas ao ambiente virtual. O contato olho no olho foi substituído por mensagens, emojis e reações rápidas nas redes sociais. Isso acabou moldando um novo jeito de se relacionar, mais silencioso, mais visual, menos falado.
E esse padrão não ficou restrito às redes. Ele está aparecendo também em momentos que antes exigiam alguma desenvoltura verbal, como pedir comida em um restaurante, conversar com um vendedor ou até participar de uma entrevista de emprego.
Mais do que timidez, o que se percebe é um certo desconforto diante de interações presenciais espontâneas. Uma pausa antes de falar, uma dúvida sobre como agir, ou mesmo um receio de errar ou ser julgado. Para os mais velhos, pode parecer estranhamento ou desinteresse. Para os mais jovens, é só o jeito com que aprenderam a estar no mundo.
Em restaurantes, essa mudança de comportamento tem impacto direto. Quando o cliente não responde, tudo fica mais demorado. O garçom precisa repetir a pergunta, às vezes mais de uma vez, até que alguém finalmente diga: “um refrigerante, por favor”.
Alguns profissionais relatam que, quando finalmente recebem uma resposta, é comum que o jovem pareça até surpresa, como se não esperasse ter que verbalizar algo que já estava “claro” no seu olhar ou na sua presença.
Para quem trabalha com atendimento, esse tipo de situação exige paciência e jogo de cintura. Ainda mais em lugares onde o tempo é curto, a casa está cheia e a expectativa é de um serviço ágil e simpático. Restaurantes em áreas turísticas, como as tavernas gregas ou os quiosques no litoral brasileiro, valorizam justamente o calor humano — e é aí que o contraste se acentua.
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Quando gerações se desencontram
Essas diferenças não são novidade. A cada geração, há mudanças no vocabulário, no comportamento e nas formas de se expressar. A questão com a Geração Z é que as mudanças vieram rápido, impulsionadas pela tecnologia e pelo distanciamento social dos últimos anos.
Em culturas como a brasileira e a grega, onde o contato direto, o sorriso e a conversa olho no olho são considerados parte do bom atendimento, esse silêncio repentino pode causar estranhamento. Para um atendente experiente, pode parecer que o jovem está sendo frio ou distante. Para o jovem, pode ser apenas uma tentativa de se proteger ou de não ultrapassar limites.
Enquanto os mais velhos foram ensinados a cumprimentar, agradecer e puxar conversa, muitos jovens se sentem mais à vontade com respostas curtas ou até mesmo sem responder. E isso pode gerar ruídos na comunicação dos dois lados.
Como lidar com isso?
É importante saber lidar com esse comportamento da Geração Z. Foto: Brazil Greece.
Não existe uma fórmula pronta. Mas há caminhos possíveis.
A recomendação de especialistas em atendimento é manter a abordagem acolhedora e respeitosa. Repetir a pergunta com gentileza, sorrir, tentar criar um clima leve. Às vezes, um simples “fica à vontade, quando quiser me chama” pode quebrar a tensão.
Alguns restaurantes têm investido em treinamentos específicos para ajudar suas equipes a lidar com diferentes perfis de clientes, inclusive os mais silenciosos. Outros têm apostado em cardápios digitais e sistemas automatizados de pedidos, o que, por um lado, facilita o atendimento, mas por outro, reforça a distância.
Pais e educadores também têm um papel importante nisso. Incentivar a prática do diálogo, ensinar a importância da gentileza verbal e preparar os jovens para interações sociais do dia a dia são atitudes que fazem diferença, dentro e fora de casa.
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Um mundo mais visual e menos falado
No fundo, o “Olhar Gen Z” revela muito mais sobre o nosso tempo do que parece à primeira vista. Ele mostra que a forma de se comunicar está mudando, e que isso afeta até as situações mais simples.
Para quem trabalha com público, o desafio é entender esses sinais e aprender a responder com empatia. Para os jovens, talvez seja o momento de reconhecer que nem sempre o silêncio fala por si, e que, às vezes, dizer um simples “por favor” ainda é o melhor caminho.
No fim das contas, seja em um restaurante de São Paulo ou em uma taverna à beira-mar em Mykonos, todos estamos aprendendo a conviver com essas novas formas de estar juntos, mesmo quando o pedido vem apenas com um olhar.
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